Por
que São Tomé?
Wanderlino
Arruda
Se o assunto está espichando
muito, a culpa pode ser debitada ao
leitor. A culpa ou o mérito,
porque o leitor, em primeira e última
análise é quem determina
o caminho que deve ser seguido pelo
cronista. Quando escrevemos em jornal,
nosso maior prêmio é
a leitura imediata, a apreciação
do conteúdo, os comentários
que fazem amigos e adversários,
conhecedores, doutores ou simplesmente
curiosos. Não adianta escrever
para não ser lido. Quem escreve
para si mesmo não deve publicar
o que produz e os escritos poderão
continuar guardados, em gavetas ou
dentro de folha de livros, embora
esse ato possa prejudicar a um virtual
leitor, muitas vezes necessitando
de uma talvez preciosa informação.
Mas qual é mesmo o assunto
que eu estou espichando? Nomes de
ruas, uai!... Esse manancial que Montes
Claros oferece a mancheias, rico,
quase folclórico, divertido,
de certo modo até com características
históricas, o que poderá
ser útil, no futuro, a alguém
que deseje inventariar ou associar
fatos da vida da cidade.
Combinei com Haroldo Lívio
para ele escrever o que sabia, já
que ele foi o puxador do samba, mas
o meu caro amigo e colega, num terrível
silêncio, bateu asas e voou
para um congresso de oficiais de cartórios
em plena realização
na bela Fortaleza do Ceará.
Pode sr que, de lá, o Haroldo
mande pelo menos um postal para o
Lazinho, dizendo não ter se
esquecido dos tão saudosos
Montes Claros dessa iniciante primavera.
Minha história de hora é
ainda do bairro Todos os Santos, pedaço
de terra que o Simeão Ribeiro
Pires santificou desde o papel vegetal
do projeto-piloto, quando ele tinha
escritório ao lado do Colégio
Imaculada, naquele velho prédio
da fábrica de tecidos de sua
família. Digo minha história,
porque nesta eu tomei parte, parte
ativa. Foi uma pacata sessão
de nossa Câmara Municipal, com
todos os senhores vereadores presentes,
num dia em que alguém disse
não poder o bairro Todos os
Santos ter uma rua com o nome de Antônio
Narciso, não sendo ele santo
de papel passado, embora membro de
uma tradicional e respeitável
família, a mesma do colega
Paulo Narciso, o homem da FM. Haveríamos,
então, de achar um nome de
santo, para a rua que hoje é
chamada de São Tomé.
A primeira sugestão de projeto
partiu de Jonas Almeida, que propôs
o nome de São Judas Tadeu.
Neco Santamaría não
gostou da idéia e protestou
na hora: São Judas não
podia ser, porque é nome de
traidor, que tinha vendido o chefe
para os judeus. Não sei se
foi o Humberto Souto que tentou um
conserto de situação,
indicando o nome de São João
Nepomuceno. Ainda aí, Neco
não concordou, dizendo que
esse nome também era suspeito,
muito complicado. Explicado tudo muito
bem explica, que S. Judas Tadeu era
outro que não os Iscariotes,
que São João Nepomuceno
era até nome de cidade, tão
bom que era, o Neco continuou irredutível.
Além disso, havia muita rua
com o nome de São João,
inclusive no bairro. Que arranjássemos
um outro.
Foi nessa hora que me lembrei de um
velho amigo que, antes da abertura
da rua, já morava naquele local,
atrás do campo do Cassimiro
de Abreu. Era um servente de pedreiro
muito bom, alegre, trabalhador, casado
com uma senhora muito distinta, boa
lavadeira, boa doceira, prestativa.
D. Pedrelina. Nunca ninguém
jamais havia ouvido falar mal dele,
era bom companheiro e bom vizinho,
e tinha um nome muito sugestivo, de
santo muito conhecido: chamava-se
Tomé. Tomé de que, não
sei. Tomé nome de santo. Neco
protestou, ainda, dizendo que esse
santo não tinha fé,
e precisou de colocar o dedo na ferida
de Jesus Cristo para acreditar na
verdade. Não teve jeito, a
Câmara estava decidida Convencemos
o Neco, que esse São Tomé
era muito bom, tinha até os
méritos das ciências
exatas, porque queria ver e tocar
para crer. A decisão não
demorou e foi unânime. Hoje
a rua chama-se RUA SÃO TOMÉ,
e tem moradores muito importantes...