Aos
poucos, quando vem chegando o final
da carreira, é começar
a pensar na sempre tão sonhada
situação de aposentado,
fazer o exame de consciência
necessário para interpreta-la
compreende-la, saboreá-la
por antecipação. Parece
que não existe trabalhador
que não pense, não
sonhe com o que chama de merecida
aposentadoria. Conheço gente
que tem quatro ou cinco anos de
carteira assinada e já fala
nos dias futuros em que não
mais terá de assinar o ponto
todas as manhãs, aquela vocação
de quem não nasceu para as
amarras do assalariado, que todo
empregado é, seja humilde,
seja granfino. De mansinho vem a
idéia de interpretação
se realmente a aposentadoria é
mesmo um prêmio.
Francamente, não sei se a
aposentadoria não seja mais
um castigo, algo de punição
para modificar hábitos, desorganizar
arraigados modos de vida, avacalhar
o coreto do dia-a-dia dos trabalhadores
e das famílias. Já
imaginou, de uma hora para outra,
não ter o que fazer? Ficar
o dia todo dentro de casa, aranhando,
vivendo sem pressa, desarrumando
e arrumando papéis velhos,
passando a toda hora perto das panelas
na cozinha, beliscando, comendo
antes do horário? Ou, de
forma diferente, tendo de viver
o dia todo no Quarteirão
do Povo, de pé, conversando
as mesmas conversas, “resolvendo”
eternamente os mesmos problemas
que os governos nunca resolvem?
Francamente, minha senhora, não
sei!
O conselho de quem sabe e já
passou pela experiência é
que o problema menor do aposentado
é a questão financeira.
Nessa até que se dá
jeito, podendo ser reforçada
com alguns “bicos” aqui
ou ali. O que precisa ser suportado
rom galhardia é o descompasso
violento entre algumas obrigações
e a ociosidade. Há de haver
uma preparação espiritual
para receber os acontecimentos nunca
como castigo, descobrir as regalias,
interpretar tudo como prêmio
merecido, abrir opções
de lazer, visitas possíveis
e que não incomodem os visitados,
prática de alguns esportes
também possíveis e,
sobretudo, a consciência do
que não pode ou não
deve ser feito.
Em todo caso, vejamos alguns pontos
positivos para os aposentados, nas
palavras de um colega de muita experiência
no assunto. O primeiro e mais agradável
é a desobrigação
dos horários rígidos,
da responsabilidade de sentir-se
sempre como peça importante
de uma máquina que nunca
pára, o que costumo chamar
de servidão do relógio,
disciplina, administração
do tempo. Depois, há os favorecimentos
da liberdade do ir e vir, do alimentar-se,
do dormir na hora que mais convém,
do não ter pressa, de ter
todos os dias como domingos e feriados,
do direito de tomar sol ou esconder-se
do frio. Melhor, do viajar, de chegar
e sair sempre que pedir licença.
Assim é a vida. Até
as coisas boas trazem problemas.
Se todos nós preocupamos
tanto com o muito fazer, por que
esquentarmos a nossa cabeça
com o “dolce farniênte”,
com o papo pro ar, a perna pra cima?
Melhor aprender a suportar a realização
dos sonhos. Isso, afinal, até
que é bom!