Cada viagem à Amazônia
tem e terá o seu gosto particular,
sabor de tempero diferente. É
como se cada entrada na selva representasse
sempre uma primeira vez, uma virgindade
de vida e de experiências, virgem
a mata, virgens os rios e os igarapés,
com água que passam e não
voltam jamais. Um mistério,
um sonho, hiper-realidade, o jângal
amazônico do tamanho de um vasto
mundo, um sufoco de escuridão
de matas, uma superfície inacabável
de águas, com horizontes cada
vez mais distantes. Só se sabe
que é rio e não é
mar, porque a água é
doce e não salgada, é
barrenta e não azul. Por questão
de ondas e de marés quase não
seria possível diferenciar,
pois nisso os rios da Amazônia
são bem parecidos com os oceanos.
O vento sopra onde quer, ninguém
sabe de onde vem, nem pra onde vai.
Tudo é uma só imensidão.
Da primeira vez, em Manaus, com Olímpia
e Ana Irlanda, o desconhecido total
com todas as doses de aventura entre
alguns civilizados e uma maioria de
quase selvagens. De segunda, com um
grupo de colegas de São Paulo,
do Paraná, do Rio Grande do
Sul e do Ceará, vi e vivi uma
saga de alegrias e temores, com filmagens,
fotos, experiência direta da
selva, com o calor do amanhecer e
o calor da chegada da noite: Ivone,
Rosa, Maria de Jesus, Roberto, Gazzaneo,
tantos e quantos outros companheiros
de trabalho de boa temporada em Brasília.
A terceira, partindo de Belém,
só gente de Montes Claros,
participantes de um congresso de hotéis
e restaurantes, companheiros de descidas
em Salvador, Recife, Fortaleza e São
Luiz, em cada local reminiscências
para nova estórias. Um traço
comum em todas três viagens:
barcos sem salva-vidas, porque salva-vidas
só sobram para turistas estrangeiros,
os granfinos que pagam em dólares.
Em Belém, a mataria está
em volta, beira de cidade, tão
alta e tão sombria que pouco
se vê da luz do sol tropical,
quando muito, frestes, revérberos
fracos de claridade. Uma multidão
de cipós e galhos e folhas
que se cruzam, um vaivém frenético
de ramagens que balançam à
brisa calma e quente. Silêncio
humano, barulho da natureza, umidade
só, universo quase líquido
e de clorofila, toda a vida planetária,
fora o bicho homem, parece estar ali.
E está! Tudo em quantidade
inimaginável, tudo sobrando,
desperdício de beleza e mistérios.
Afinal, o guia nos mostra uma casa
de taipa, fechada só dos lados,
fogão tosco, sem a presença
de qualquer móvel doméstico,
um único jirau para não
dizer que só existe o vazio.
Penduradas, muitas redes, oito ou
dez, parece para servirem de assento
e de dormida. Um homem, uma mulher,
dez garotos moreninhos, que sobem
no açaizeiro tão rapidamente
como se fossem micos de circo. Trepar
em árvores é para eles
tão natural como nadar nos
caminhos de igapós, faz parte
do viver. Achando a família
bem grandinha, pergunto ao dono da
casa quantos filhos eles tem.
- Com esta mulher, tenho estes dez.
Com a que deixei lá pouco tempo,
tinha onze.
- O senhor tem 21 filhos? –
Perguntou Luiz Salvador.
- Vinte e um com as duas derradeiras.
Mas eu já consumir mais três,
antes, com dez filhos cada uma. Ao
todo já espalhei no mundo 51
moleques, gente pra chuchu.
Foi aí que Nídia –
doutora-médica, não
agüentando a curiosidade e o
interesse científico, perguntou
de queima-roupa:
- Ouvi, antes, o senhor dizer que
tem 60 anos; como está muito
novo, parecendo ter pouco mais de
40, pode me dizer o que fazer para
se conservar assim? Tem alguma coisa
que toma para não envelhecer?
Qual é o segredo? – Concluiu
sorrindo.
- Tomo nada não, dona. Sou
assim porque a vida aqui é
maneira, não tem barulho de
cidade. Mas já que a senhora
quer saber, eu não tomo, mas
tem os outros por aí que tomam
maripuama. O homem fica bom de mulher
e bom de filhos.
- Foi nesse ponto, que não
pude deixar de entrar na conversa.
Perder tempo pra quê? É
a chance, amigos. “Onde é
que a gente encontra esse remédio?”.
- Lá mesmo onde vocês
desceram do barco, naquela vendinha.
– Respondeu o caboclo. Compra
os galhos, tira a casca, põe
no vinho, e deixa três dias
no sereno. É tiro e queda,
faz até milagre!
- Claro que, na volta, antes de entrar
de novo no barco, o dono do armazém
vendeu muito pedaço de pau
e uma raizada de dar gosto! Só
eu comprei dois quilos, que estou
guardando para o futuro.