A
lembrança mais antiga que tenho
de Osmar Cunha é de Taiobeiras,
ano de 1948, quando ele, estudante
de contabilidade em São Paulo,
veio passear por um período
de férias. Sério e alegre
ao mesmo tempo, mais novo do que a
idade exigia, era a elegância
em pessoa, com ternos e gravatas da
última moda, tecidos caros,
cortes perfeitos. A qualidade estava
numa distância enorme para a
de uso de qualquer outro vivente comum,
inclusive a de seu irmão Dudu
Cunha, que também sempre foi
muito granfino. Ninguém vestia
ou calçava como Osmar, porque,
de São Paulo, ele sempre escolhia
o melhor, uma vez que dinheiro e bom
gosto nunca lhe foram problemas. Invejado
por nós, pobres mortais de
Taiobeiras? Não, não
creio. Na verdade, Osmar Cunha era
é respeitado, admirado, elevado
a um patamar, algo assim como se fosse
herdeiro do trono do Brasil. O melhor
a quem de direito!
Também não me lembro
de Osmar namorador como Dudu, ou como
qualquer outro de nós, mesmo
os meninos, que normalmente tinham
mais de um “Flirt” Osmar
era comedido, calmo, mais ligado às
pessoas de idade, para conversas de
assuntos mais importantes. Mesmo para
uma cidadezinha culta como era Taiobeiras
em 1949, quando se discutia literatura,
acontecimentos mundiais, artes, esportes,
concursos de misses, quando existia
uma meia dúzia com algum domínio
do inglês, Osmar ainda era considerado
de padrão superior, principalmente
por morar e estudar no centro da cidade
de São Paulo, como filho de
família rica. Mas, no meio
de toda importância, Osmar fazia
algumas concessões ao jogar
futebol, nadar na barragem, jogar
pôquer, danças, dar voltas
em torno da feira de quiabo, ir à
missa na antiga igreja perto de sua
casa. Namorar, namorar, que era o
esporte mais gostoso era só
com a Laury, a moça mais culta
e mais bonita, também viajada
e lida como ele. Ou mais que ele!
Não me lembro de Osmar político,
candidato a prefeito de Taiobeiras,
porque aí, eu já morava
em Montes Claros. Talvez por uns dois
passeios rápidos por lá,
quando eu ia ver Olímpia e
a minha família, tenho lembranças
poucas, “flashes” dos
acontecimentos, com um quadro mergulhado
de paixões, a situação
batendo duro, furtando escandalosamente
para não perder o mando, não
respeitando nem a elegância
de Osmar. Lembro-me de Laury lutando
com todas as forças, até
pegando em armas, como um dia em que
ela espantou uma multidão de
adversários, fazendo todos
correrem sob a mira de uma carabina.
Mas de Osmar, não me lembro!
Sua capacidade só diplomática,
elevada, acima das efervescências
maledicentes, não pôde
lhe conduzir a vitória. Votos
comprados, urnas fraudadas, todo tipo
de astúcias e tramóias
dos adversários tiraram a sua
vez. Triste e desiludido mudou-se
para Montes Claros. Secretamente,
caladão, nunca cicatrizou a
paixão da derrota. Com amargo
sorriso era que falava da política
de Taiobeiras. Acredito que esperava,
se mais vivesse, dar um elegante troco
àquela gente de sua terra.
Em Montes Claros, sempre comerciante,
ao lado de Dudu ou sozinho, Osmar
talvez tenha sido o empresário
mais amado e querido por seus clientes
e fornecedores. Não sei e talvez
ninguém saiba de alguém
que não gostasse dele. As pessoas
o adoravam e nele confiavam sem limitações.
Nenhum documento valia mais que a
palavra de Osmar. Nenhum prazo era
tão rígido no comércio
que ele não pudesse ceder em
favor de um devedor mais apertado.
Quantas vezes Dudu não ficou
com o coração nas mãos
diante da bondade de Osmar, sempre
ajustando vencimentos, sempre ajudando
alguém! Osmar era uma espécie
de pai dos pobres e deserdados, que
o digam os pequenos comerciantes de
Montes Claros e de todas as cidades
do Norte de Minas e Sul da Bahia.
Até hoje vejo-os chorar de
saudades!
Osmar Cunha, elista, rotariano, marido,
pai, irmão, companheiro e professor
de muitos, nunca foi um homem comum,
nem só um homem elegante. A
estrela de ouro que, por nobreza,
deixou no mundo, por muito tempo ainda
brilhará e abrirará
caminhos de luz, de amizade e de admiração!