João
Murta,
diamante De Grão Mogol
Wanderlino
Arruda
João
Murça Júnior,
filho de João Murça.
João Murça Júnior,
pedra preciosa, natural de Grão
Mogol,
diamante lapidado na alegria e nos
vendavais da sorte e do trabalho;
João Murça Júnior,
grande amigo, companheiro, mestre,
irmão.
“Quem diz que Amor é
falso ou enganoso,
Ligeiro, ingrato, vão, desconhecido,
Sem falta lhe terá bem merecido
Que lhe seja cruel ou rigoroso.
Amor é brando, é doce
e é piedoso.
Quem o contrário diz não
seja crido;
Seja por cego e apaixonado tido,
E aos homens, e inda aos deuses, odioso
“.
(Luiz de Camões)
Garimpeiro,
músico, delegado, juiz de paz,
homem macho sim senhor! Oitenta e
quatro anos de vida, garotão
do século passado, nascido
na Rua Direita, a rua mais torta de
Grão Mogol. Dezoito de março,
signo de Peixes, mutável, inquieto,
constante na abertura de caminhos
pela vida, sempre bem-humorado, sincero,
simpático. João Murça
Júnior, eterno diplomata, cavador
do bom destino. Duro na queda!
Aluno de dois grandes professores
– Professor Carlos Catão
Prates e Professor Arthus Valle -,
Murça fez um bom curso primário
e teve, no final, uma festa de banda
de música, de diploma enroladinho
com laço de fita, cumprimentos
do professor, sorrisos dos parentes.
Todo mundo alegre, de roupa engomada,
limpinha de fazer gosto! Curso bem
feito, daqueles que valem mais do
que um curso ginasial de hoje, isso
que chamam por aí de primeiro
ciclo do segundo grau. Sabidão,
João Murça cedo esquentou
os motores e, já com 19 anos,
tinindo de coragem, botou o que tinha
nas costas, junto com a matalotagem
de arroz-com-frango-e-farofa, e foi
a pé até Buenópolis,
onde tomou o trem para São
Paulo. Gastou 9 dias na caminhada,
no dedão, e mais algumas noites
até chegar a Ribeirão
Preto, com uma despesa enorme de 100
mil réis, o que vale em câmbio
atual à elevada quantia de
C$1,00. Bons tempos, dizem os saudosistas.
Bons tempos, principalmente, para
um rapaz de 19 anos, com toda a saúde
do mundo e uma multidão de
sonhos e desejo de viver!
Em Ribeirão Preto, 1918, Murça
foi trabalhar na Força e Luz,
passando logo a Fiscal Geral da Companhia.
Em 1919, esteve ele pertinho do Presidente
Epitácio Pessoa, que foi o
Governador Seabra, da Rainha, lançar
a pedra fundamental de uma metalúrgica.
O mundo já vivia a era pós-Primeira
Guerra Mundial. Murça tinha
20 anos em flor, era solteiro, doido
com mulher, como é ainda até
hoje! Um perigo!... Alguns anos de
trabalho viveu em São Paulo
até que a Bolsa de Valores
de Nova York recebeu a pancada do
“crack” e da quebradeira
internacional. O café brasileiro
baixou de preço, foi para as
fogueiras mandado pelo Presidente
Getúlio Vargas, São
Paulo numa contrariedade terrível.
Volta a Grão Mogol, para matar
as saudades de 1925 e casar-se com
D. Marieta Rodrigues Murça,
professora e musicista, maestrina
bacana, bonitona, granfina, moça
refinada de todas as prendas. Homem
sério, Murça faz sociedade
com o banqueiro Clemente Faria e compra
um escafandro para minerar diamantes
nos poços de Grão Mogol.
É um novo homem, em novo início
de vida.
Fazendeiro no Itacambiruçu,
comerciante, Juiz de Paz, Vereador
pela UDN, Oficial de Justiça,
Delegado de Polícia, correspondente
bancário, do Crédito
Real. Como delegado, ficou 6 anos,
prendendo e soltando os cabras safados,
curando cachaçada dos cachaceiros
da melhor cachaça do mundo.
E, para ser delegado, teve de contar
com a proteção do Deputado
Juscelino Kubitschek, a pedido do
prefeito Washington Barbosa de Araújo,
do PSD. Uma contradição,
porque Murça era “lenço
branco” da campanha do Brigadeiro
Eduardo Gomes e do Governador Milton
Campos.
Filho da mãe, esse Murça,
sócio de banqueiros e protegido
de figurões.
Murça mudou-se para Janaúba
em 1959, vivendo lá 9 anos,
até quando veio para Montes
Claros, em 1967, já aposentado.
Lá em Janaúba, sua política
era a do PSP, partido populista do
Sr. Ademar de Barros. Por aquelas
bandas, também foi comerciante
e delegado de Polícia, além
de fazendeiro. Deixou de trabalhar
duro mesmo foi em 1960, quando o antigo
IAPC o colocou na vida boa, de quem
não tem compromissos com horários.
Em Montes Claros, como em Janaúba
e Grão Mogol, viveu sempre
no centro da cidade, pois, foi sempre
metido a granfino!
E o Murça marçom? Aos
7 ou 8 anos, conheceu o antigo salão
da “Aurora do Progresso”,
loja de 92 associados em Grão
Mogol. Era um terror até pensar
em Maçonaria. As piedosas Filha
de Maria sentiam até arrepios
só em ouvir falar do bode preto!
Cruz credo, como podiam aqueles homens
importantes e ricos mexerem com uma
coisa perigosa destas? Tinham medo,
mas, respeitavam. A Aurora do Progresso
era uma das maiores lojas maçônicas
do Brasil.
Murça é filho da Deus
e Liberdade, desde 14.3.50, quando
era Venerável o inesquecível
Sebastião Sobreira. Passou
por Chico Tófani, passou por
João de Paula, passou por José
Gomes, passou, passou por todos, velhos
e novos que lutaram para nos trazer
até hoje este grande legado.
Companheiro em 16.3.62 e Mestre em
13.7.62 foi mudando de avental, branco,
branquinho, azul claro, vermelho,
pretão parecendo cartola do
Vasco, branco de novo, com todos os
enfeites do Grau 33, desenho bem trabalhado
de pelicano. Ao grau 18, cavaleiro
rosa-cruz, com diploma do Supremo
Conselho do Brasil, foi elevado em
30.12.1967. Lembro-me muito bem da
festa do final de carreira, quando
fomos, em 8.10.76, elevados ao 33,
juntos com pequeno número de
irmãos. Murça o mais
velho, eu o mais novo. Ele com muitos
cabelos ou todos os cabelos brancos,
eu com os cabelos pretos, mas, já
quase sem cabelos. Chegava-mos à
posição de Grandes Inspetores
Gerais da Ordem. Pelo menos, ele Murça
tinha todo merecimento. Era um prêmio
ao trabalho e à fraternidade
desse velho guerreiro!
Murça, fundador, um dos fundadores
da Loja Estrela de Montes Claros.
Murça, fundador da Loja Maçônica
Deus, Paz e Liberdade II, de Janaúba.
Murça, reativador da Loja Maçônica
Aurora do Progresso, de Grão
Mogol, oficina que o viu nascer. Murça,
herói da Deus e Liberdade,
hoje Membro-honorário, sócio
por motivo de honra. Honoris causa.
Murça, amigo e irmão:
Suporta ainda o fardo de tuas obrigações,
Caminha valorosamente, segue a tua
estrada.
Do acervo de pedra bruta nasce o ouro
puro.
Do cascalho pesado emerge o diamante,
Do peso que transportamos de boa vontade,
procede nas lições de
que necessitamos para a vida maior!
Se o suor te alarga a fronte e se
a lágrima te visita o coração,
é que a tua lágrima
te visita o coração,
é que a tua carga já
se faz menos densa, convertendo-se,
gradativamente, em luz para a tua
e nossa ascensão!
Tudo isso amigo e irmão Murça,
graças ao Grande Arquiteto
do Universo.
(Este
discurso-crônica foi o centro
das homenagens que a Loja Maçônica
“Deus e Liberdade”, de
Montes Claros, prestou, há
pouco tempo, a um dos seus mais antigos
filiados, João Murça
Júnior, foi homenageado com
o diploma de “Membro Honorário”.
Para Murça foi difícil
o controle: chorava e sorria ao mesmo
tempo).
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