Muito
gratificante a cerimônia de
minha posse, ocorrida dia 21, como
membro efetivo do Instituto Histórico
e Geográfico de Minas Gerais,
instituição que em
mais de cem anos conta com o trabalho
de pesquisa de cem intelectuais
da história, da geografia,
da geologia de nosso estado e de
outras partes do país. Presentes
importantes colegas de Belo Horizonte
e de outras cidades mineiras, muito
gratas para mim as presenças
de velhos e novos amigos, companheiros
de escrita e de outras instituições
como Rotary e Academia de Letras,
além de conterrâneos
e queridos familiares.
Muitos
os assuntos, muitas as perspectivas,
muitas as emoções,
limitar-me-ei, hoje, a falar do
meu patrono Manoel da Costa Athayde,
que foi o também da nossa
inesquecível doutora Sandra
Loureiro de Freitas Reis, mestra
do Direito e da Música, professora
emérita da UFMG, que ocupou
de 27 de março de 1993 a
7 de maio de 2008, a cadeira 78
do Instituto. Deixem-me percorrer
territórios santificados
de Ouro Preto, Mariana, Santa Bárbara,
Itaverava e do Caraça, não
com a ligeira curiosidade do turista,
mas com a fome substantiva de um
também pintor. Quero ver
e aprender com Athayde, mestre criativo
e renovador da pintura sacra mineira.
Privilegiem-me com o direito de
dizer que a história de Minas
não seria tão rica
se não houvéssemos
tido o Athayde dos andaimes e dos
tetos das mais lindas igrejas da
nossa história.
Pintor,
dourador, encarnador, entalhador
e professor de pintura, sem favor
nenhum, Manuel da Costa Athayde
é considerado o mais importante
artista da mineira pintura barroca.
De Mariana, nascido em 1762, teve
como expressão artística
o uso delineado de cores vivas,
principalmente o azul, a cor do
céu e dos infinitos. Em seus
desenhos, mais do que perfeitos,
as madonas, os santos e os anjos
são sempre de feições
e tons de África. Contemporâneo
e parceiro de Aleijadinho, durante
37 anos, Mestre Athayde encarnou
e dourou imagens para o Santuário
do Bom Jesus de Matosinhos, em Congonhas
do Campo.
Segundo
nossa queridíssima Regina
Almeida, há muito na obra
de Athayde além das análises
acadêmicas, por melhor que
estas sejam. Melhor interpretá-lo
com a cordialidade de quem sabe
amar artista e arte, e ver a sua
mineiridade barroca enriquecida
pela moreneza da mulher amada, de
seus filhos e de seus anjos, uns
e outros de encarapinhados cabelos,
todos de brasileiríssima
tez mulata. Importante entender
que foi Mestre Athayde um dos primeiros
pintores a usar como modelo a própria
mulher. Com D. Maria Raimunda do
Carmo, com quem nunca se casou,
deu parecências de Brasil
à Virgem da Anunciação.
Pintor de cores insabidas –
como o qualificou Carlos Drummond
de Andrade – foi Athayde o
retratista único de Aleijadinho
e do Irmão Lourenço,
fundador do Caraça. Pintor
de coisas imaginadas, suas duas
inovadoras e movimentadas santas
ceias têm, além de
Jesus e dos apóstolos, vários
serviçais alegres e comunicadores,
entre eles mulheres deveras descontraídas,
o que pode indicar permissivo código
para várias leituras. Vale
apreciar a pintura imitando azulejos,
vale contemplar a vida de Abraão,
tudo lindo e ainda mais do que lindo.
Recordar
vida e trabalho do mestre Athayde
é viver e reviver as glórias
de um maravilhoso e importante tempo
da história de Minas e do
Brasil. Foi ele um verdadeiro mestre
em todos os sentidos, como pessoa
e como artista maior.